Entre 2015 e 2013, emendas de execução obrigatória saltaram de R$ 9,7 bilhões para R$ 28,9 bilhões. Parlamentares aproveitaram fim do ‘orçamento secreto’ para ampliar independência em relação ao Executivo. O Congresso Nacional triplicou sua fatia de comando sobre o Orçamento federal ao longo dos últimos oito anos.
Entre 2015 e 2023, o valor das emendas impositivas – indicações de parlamentares que têm execução obrigatória e, por isso, não dependem de barganha com o Executivo – saltou de R$ 9,7 bilhões para R$ 28,9 bilhões. A alta é de 298%.
Do total previsto para 2023:
R$ 21,2 bilhões se referem a emendas individuais, propostas por cada deputado e senador;
R$ 7,7 bilhões são emendas das bancadas estaduais, de autoria coletiva.
As emendas são propostas por meio das quais os parlamentares destinam recursos a suas bases eleitorais.
O último movimento para ampliar o poder do Legislativo sobre as verbas foi feito na semana passada, logo após o Supremo Tribunal Federal (STF) declarar inconstitucionais as emendas de relator – aquelas que eram chamadas de orçamento secreto.
Após a conclusão do julgamento, os parlamentares incluíram na proposta de emenda à Constituição (PEC) da Transição um dispositivo que transferiu metade do valor do orçamento secreto (R$ 9,5 bilhões) para as emendas individuais – que são impositivas.
A partir de agora, a União fica obrigada a pagar as emendas individuais em um limite de 2% da receita corrente líquida. Esse termo se refere à arrecadação tributária do governo, depois de excluídas as transferências a estados e municípios. Antes da PEC, o limite era menor, de 1,2%.
A mudança parece pequena, inferior a um ponto percentual. Mas na prática, para 2023:
o valor para cada deputado passa de R$ 19,7 milhões para R$ 32,1 milhões;
o valor para cada senador passa de R$ 19,7 milhões para R$ 59 milhões.
Os dados são da consultoria de Orçamento da Câmara.
Fortalecimento do Legislativo
O aumento do controle do Legislativo sobre o orçamento começou em 2015, quando o Congresso aprovou uma PEC e tornou obrigatória a execução das emendas individuais.
Em 2019, o Congresso fez o mesmo com as emendas das bancadas estaduais. Quando a execução é obrigatória, o parlamentar não precisa ficar cobrando o Executivo para que o dinheiro seja liberado – momento propício para a negociação de votos ou apoio a alguma medida.
Os parlamentares também tentaram, por diversas vezes, tornar impositivas as emendas de relator. A tentativa, contudo, sempre emperrou durante as discussões do Orçamento no Congresso e nunca foi levada a cabo.
Isso significa que, na prática, o governo nunca foi obrigado por lei a pagar as emendas de relator, embora houvesse a cobrança política para a liberação dos recursos.
Na prática, as emendas eram usadas como moeda de troca para que o Executivo conseguisse aprovar matérias de seu interesse no Congresso. Era comum que, às vésperas de uma votação crucial, bilhões fossem desbloqueados nessa área do orçamento.
Orçamento com o parlamento
Estudo do Instituto Millenium elaborado pelo professor do Insper Marcos Mendes, em abril, mostra que o Legislativo brasileiro é o que tem o maior controle sobre o orçamento federal, se comparado a 30 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
No levantamento, Mendes afirma que as emendas parlamentares, em sua maioria, decidem quanto à realização de obras em municípios específicos – e que tais decisões “conflitam com as diretrizes gerais de políticas públicas”.
Segundo ele, não há tempo suficiente nem procedimentos adequados para análise de mérito ou de consistência de número tão elevado de emendas.
“Simplesmente entrega-se uma fatia do Orçamento à decisão individual ou de grupos de parlamentares, e gasta-se o dinheiro sem qualquer preocupação com os custos e benefícios envolvidos”, escreve o economista no relatório.
A visão, no entanto, é contestada pela cúpula do Congresso.
Parlamentares defendem que, com a impositividade, o Congresso passa a depender menos do Executivo – o que reduziria as chances de uso do mecanismo como moeda de troca.
Em 2019, o então presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (União-AP), afirmou que a aprovação da impositividade das emendas de bancada era uma “carta de alforria” que os parlamentares dariam aos prefeitos e governadores.
Segundo Alcolumbre, a partir da obrigação de pagamento, os políticos locais ficariam “desobrigados de mendigarem atenção do Executivo nacional”.
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