Especialista alerta que desinformação é campanha permanente, e se espalha além das redes sociais. ‘Se não tiver regulamentação, se não tiver responsabilização, não tem como isso não passar a ser uma estratégia de todos’, diz a diretora do NetLab da UFRJ e coordenadora da pesquisa, Marie Santini. Professora da UFRJ fala em ‘infraestrutura de desinformação muito bem montada da extrema direita’
Um estudo realizado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) aponta que a circulação de fake news aumentou no segundo turno das eleições, em comparação ao primeiro turno.
O crescimento foi registrado no Telegram (23%), Whatsapp (36%) e Twitter (57%). Já no Youtube (17%), Facebook (9%) e Instagram (5%) houve queda, especialmente por conta de um pico de mensagens falsas nessas redes no fim de semana da eleição. No geral, no entanto, a média diária de mensagens falsas cresceu de 196,9 mil antes do primeiro turno para 311,5 mil depois.
Segundo a diretora do NetLab da UFRJ e coordenadora da pesquisa, Marie Santini, as estruturas de desinformação estão cada vez mais sofisticadas e atingem não só as bolhas nas redes sociais, mas se espalham pela sociedade mesmo fora da internet. Apesar de estarem em evidência nesta época, ela afirma que a campanha da desinformação é permanente e está ganhando escala cada vez maior, com a adesão de diferentes correntes políticas.
A pesquisadora afirma que punir quem promove a desinformação é fundamental para que isso não vire uma estratégia de todos os partidos e candidatos.
“A gente vê uma infraestrutura muito bem montada da extrema direita de desinformação. E não vemos uma infraestrutura montada da esquerda. Mas se não tiver regulamentação, se não tiver responsabilização, não tem como isso não passar a ser uma estratégia de todos”, diz em entrevista à GloboNews.
Marie Santini também vê como positivas as decisões recentes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre o tema.
“Essas resoluções do TSE colocam um primeiro limite, mesmo que haja problemas. É um primeiro limite que se coloca pra gente não deixar que isso vire uma estratégia comum de todos os partidos, de todos os políticos, e de uma forma que a gente não consegue mais controlar.”
Veja outros pontos levantados pela especialista:
Complexidade da desinformação
De acordo com Marie, a máquina de desinformação está cada vez mais complexa e sofisticada, com testagem narrativas em segmentos e diferentes formas de agir em cada rede.
“A desinformação vem se complexificando ao longo dos anos. Então o que a gente está vendo em 2022 é bem diferente do que a gente viu em 2018 em termos de complexidade e de estratégia. É lógico que a desinformação sempre foi uma estratégia comum em qualquer eleição, mas com as plataformas, com as redes sociais, isso tem uma outra escala”, diz.
“Eles identificam até públicos que têm resistência a uma determinada narrativa. Testam narrativas, vão testando no WhatsApp, em redes fechadas, testam as segmentações dos anúncios. Para depois atingir esse público com a narrativa certa, através dos canais certos, da plataforma certa.”
Campanha permanente ‘fura a bolha’
A pesquisadora também aponta que a campanha permanente de desinformação aumenta a resistência dos eleitores às checagens, e deixa as pessoas sem saber em que confiar. No longo prazo, a repetição é capaz de “furar a bolha” do nicho em que foi inserida inicialmente.
“A desinformação hoje funciona através de uma campanha permanente, onde você vai reduzindo a resistência das pessoas a determinadas narrativas e aumentando a resistência das pessoas à checagem”, afirma.
“A pessoa começa a ser bombardeada por diferentes fontes. Uma narrativa repetida muitas vezes tem o efeito de começar a gerar dúvida em outro público que não seria o segmento principal de uma estratégia de desinformação, mas que acaba sendo atingido pela repetição ao longo do tempo. Então esse fomento da dúvida é uma questão muito séria. Porque aí prepara o terreno para que outras narrativas de desinformação possam ´colar’ nesse público.”
Estudo
Exclusivo: Twitter, WhatsApp e Telegram são as plataformas mais usadas na rede de desinformação
O estudo realizado pelo NetLab da UFRJ apontou que Twitter, WhatsApp e Telegram foram as plataformas com o maior aumento de desinformação no segundo turno.
O monitoramento também revelou os temas mais comentados ao longo da campanha:
Integridade eleitoral
Valores cristãos
Descredibilização da imprensa
Questões socioambientais
Gênero e família
Marie Santini ressalta que a integridade eleitoral teve um pico de menções muito grande nas fake news do primeiro turno, mas houve uma queda desse tema específico no segundo turno.
“A gente viu um aumento da desinformação vertiginoso no segundo turno. Mas quando a gente olha cada plataforma, a impressão que a gente tem é que no Youtube, no Facebook e no Instagram teve uma diminuição. Mas na verdade isso tem a ver com o que aconteceu no primeiro turno. No primeiro turno, teve um pico muito alto de desinformação contra a integridade eleitoral. Essa desinformação contra a integridade eleitoral arrefeceu um pouco. Talvez porque essa é uma pauta da extrema direita, e a extrema direita acho que se surpreendeu um pouco com o resultado nas urnas, que foi um desempenho positivo”, diz a pesquisadora.
“Quando você faz essa média do segundo turno, essa pauta como está adormecida, isso reduziu um pouco o volume, então isso mexeu com a média. Mas a verdade é que se tirar essa questão da integridade eleitoral do primeiro turno, a gente veria um aumento da desinformação em todas as redes.”
Estudo mostra desinformação veiculada no primeiro e segundo turno das eleições, em cada plataforma de redes sociais.
Reprodução/GloboNews
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