A colaboração entre o Kremlin e as emissoras estatais remonta a mais de duas décadas, disse Gatov, ex-jornalista russo e especialista em propaganda estatal. Todos os dias, o Kremlin fornece uma lista de pontos de discussão para as emissoras. O documento guardado a sete chaves, conhecido como “temnik”, é entregue a altos funcionários do VGTRK e de outras organizações, descrevendo questões que o Kremlin deseja que sejam abordadas, positiva ou negativamente, juntamente com pontos de vista para endossar e pessoas para criticar, disse Gatov, que viu cópias.
O controle rígido do Kremlin sobre a mídia aumentou desde a invasão da Ucrânia, mas a confiança das pessoas no que estão assistindo diminui à medida que a guerra avança e suas realidades violentas se tornam mais difíceis de esconder, disse Vera Tolz, professora da Universidade de Manchester, que estudou a mídia russa para o Parlamento britânico e a União Européia. “Há rachaduras”, disse ela.
Nos primeiros dias da guerra, o que não foi explicitamente delineado nas ordens do Kremlin foi deixado para os produtores de televisão preencherem.
Os Estados Unidos eram um alvo frequente, de acordo com os documentos. Todos os dias, e-mails circulavam com longas listas de clipes de notícias e postagens virais que serviam como uma paleta para pintar um quadro sombrio dos Estados Unidos.
No início de fevereiro, semanas antes da invasão da Ucrânia, os produtores sinalizaram um clipe do presidente Biden se recusando a responder a perguntas sobre o envio de tropas à Polônia, reforçando a ideia de que os Estados Unidos estavam ansiosos por uma luta. UMA história do New York Times sobre a guerra de informação agressiva da Ucrânia contra a Rússia também foi reformulado como evidência da desonestidade do país. Outra, extraída do jornal britânico Daily Mail, mostrava Biden palitando os dentes.
À medida que a guerra se arrastava, os produtores procuravam clipes sobre as consequências nos Estados Unidos. Um veio de um programa de notícias local no norte do Alabama sobre adesivos sendo colocados em bombas de gasolina que mostravam Biden dizendo: “Eu fiz isso”. Outro vídeo, mostrando uma mercearia americana vazia de comida, veio de uma postagem viral do Telegram. Pareceu inspirar uma transmissão logo depois intitulada “Choque do petróleo e prateleiras vazias: a sombria profecia de Trump está se tornando realidade”.
Em março, Denis Davydov, um repórter do VGTRK em Washington, sinalizou uma postagem no YouTube de sete anos atrás, ganhando popularidade recentemente, que afirmava que os Estados Unidos e a OTAN haviam alimentado a hostilidade da Rússia em relação à Ucrânia.