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Tim Maia, que faria hoje 80 anos, ainda é a mais completa tradução brasileira da música negra norte-americana | Blog do Mauro Ferreira

ANÁLISESebastião Rodrigues Maia (28 de setembro de 1942 – 15 de março de 1998) ainda é a mais completa tradução brasileira da música negra norte-americana, especialmente do soul. Duas décadas antes do batidão importado do funk começar a ganhar pulso e identidade nacional nos bailes de onde emergiriam estrelas como a dupla Claudinho & Buchecha e as cantoras Anitta e Ludmilla, Tim Maia – nome artístico com o qual cantor e compositor carioca se imortalizou – abrasileirou o funk e o soul que ouvira e absorvera no período conturbado em que viveu nos Estados Unidos nos anos 1960.

Tim soube traduzir o soul e o funk para o Brasil ao misturar esses gêneros com samba, baião e outros ritmos nacionais em fusão ainda hoje inovadora e inigualável. Até porque o volume do vozeirão de registro baixo-barítono do cantor também era único.

Tim Maia é da genial geração musical brasileira de 1942. A geração que legou ao mundo Caetano Veloso, Clara Nunes (1942 – 1983), Gilberto Gil, Milton Nascimento, Nara Leão (1942 – 1989), Nei Lopes e Paulinho da Viola.

Só que Tim não chegou vivo aos 80 anos, festejados hoje, 28 de setembro, com a estreia no Globoplay da série documental Vale tudo com Tim Maia, composta por três episódios orquestrados sob direção de Nelson Motta, biógrafo do cantor, com Renato Terra. Tim saiu de cena aos breves 55 anos, vitimado por vida de excessos, levada com doses nem sempre equilibradas de álcool, amor, drogas, explosões, música, risos e solidão.

Figura folclórica, Tim Maia ainda carrega a mesma sina de outro gênio forte, João Gilberto (1931 – 2019), porque ambos foram mitificados com lendas alimentadas em torno dos temperamentos imprevisíveis. Mesmo que as lendas se originem de fatos reais, e há boa dose de verdade em ambos os casos, Tim – assim como João – por vezes é injustamente mais lembrado pelos causos do que pela música.

A sorte, no caso de Tim, é que a música gerou sucessos que ainda esquentam sovacos nas pistas. Qualquer DJ sabe o efeito explosivo de tocar Não vou ficar (1969), Não quero dinheiro (Só quero amar) (1971), Sossego (1978), Você e eu, eu e você (Juntinhos) (1980), Do Leme ao Pontal (1981) e Vale tudo (1983) – músicas da lavra solitária de Tim, criador de grooves irresistíveis.

Só que o compositor – cujo suprassumo da produção autoral está concentrada em período que vai do alvorecer da década de 1970 até a primeira metade dos anos 1980 – era também um grande cantor.

Ninguém há de ser condenado nos tribunais das redes sociais por achar que O descobridor dos sete mares (Michel e Gilson Mendonça, 1983) e Me dê motivo (Michael Sullivan e Paulo Massadas, 1983) – baladão que se tornou standard do repertório nacional da dor-de-corno – são músicas de autoria de Tim. Não são. Mas também são porque Tim as tornou dele, somente dele.

O samba-soul Gostava tanto de você (Edson Trindade, 1973) também não era, mas poderia ser. Até porque, no mesmo álbum de 1973, o compositor apresentou outro samba-soul de igual alcance, Réu confesso, e este era mesmo de autoria de Tim.

Para quem quer ir além dos hits, álbuns menos badalados como Nuvens (1982) merecem ser ouvidos com atenção. Lá tem A festa, um daqueles grooves de Tim que incendeiam qualquer pista. E tem também a balada-título Nuvens, da lavra sofisticada de Cassiano (1943 – 2021), outro gênio do soul brasileiro a quem também deve ser dado o crédito pela contribuição na formatação do primeiro álbum do Síndico, Tim Maia (1970), título arrasa-quarteirão da discografia nacional pelo alto volume de sucessos.

Foi nesse disco que apareceu a balada Azul da cor do mar (1970), exemplo de como a melancolia e a solidão também estavam entranhadas na alma inquieta de Sebastião Rodrigues Maia.

Pelo fato de que todas essas músicas parecem ser imunes aos efeitos corrosivos do tempo, fica difícil imaginar que Tim Maia faria hoje 80 anos. Inclusive porque a imagem de Tim Maia cristalizada na memória nacional é a de um cara-de-pau alegre, bonachão, tão temperamental quanto sensível, dono de vozeirão de amplitude inalcançável, nem tanto pelo (alto) volume, mas pelo muito que fez pela música do Brasil.

Fonte

MicroGmx

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