Avançamos no tempo para revisitar um período conturbado no cenário da política digital. Há cinco anos, em meados de outubro de 2020, testemunhamos um espetáculo de inversões e contradições protagonizado pelo Partido Republicano (GOP) nos Estados Unidos. A pauta? A liberdade na internet e a regulação das plataformas digitais.
A virada de mesa na neutralidade da rede
O GOP, que outrora se apresentava como ferrenho defensor da neutralidade da rede – princípio que garante a igualdade no tratamento do tráfego de dados, sem discriminação ou favorecimento –, repentinamente mudou seu discurso. O motivo? O então presidente Donald Trump declarou guerra às redes sociais, acusando-as de censura e viés político. Subitamente, a neutralidade da rede, antes sacrossanta, tornou-se um obstáculo à agenda presidencial.
A guinada foi tão abrupta que a própria Comissão Federal de Comunicações (FCC), órgão regulador das telecomunicações nos EUA, sentiu-se desconfortável em endossar publicamente a investida de Trump. A FCC, que já havia demonstrado sua aversão à neutralidade da rede ao rejeitar seus próprios argumentos legais, viu-se em uma sinuca de bico. Apoiar Trump seria admitir a fragilidade de suas justificativas anteriores; discordar, desafiar o poder presidencial.
De defensores a algozes da liberdade digital
O ataque de Trump às redes sociais revelou a face mais sombria da política digital. O GOP, em vez de defender os princípios da liberdade de expressão e da neutralidade da rede, optou por instrumentalizar o debate em benefício próprio. Apoiou uma agenda de controle e punição das plataformas digitais, transformando-se em algoz da liberdade que antes tanto prezava.
Essa postura hipócrita teve um impacto devastador no debate sobre a regulação da internet. Ao politizar a questão, o GOP minou a credibilidade das discussões e polarizou ainda mais a sociedade. A neutralidade da rede, que deveria ser um princípio universalmente defendido, tornou-se mais uma arma na guerra cultural.
Lições para o futuro
O episódio de 2020 serve como um alerta sobre os perigos da instrumentalização política da internet. A liberdade de expressão e a neutralidade da rede são valores fundamentais que devem ser defendidos por todos, independentemente de suas convicções políticas. Quando esses valores são sacrificados em nome de interesses partidários, a democracia e a sociedade como um todo são as maiores vítimas.
É crucial que a sociedade civil, os veículos de comunicação e os atores políticos se unam na defesa de uma internet livre, aberta e plural. A regulação das plataformas digitais é necessária, mas deve ser feita com cautela e responsabilidade, garantindo a liberdade de expressão e a neutralidade da rede. O futuro da internet e da democracia dependem disso.
Para aprofundar a análise sobre a neutralidade da rede e suas implicações, recomendo a leitura do artigo “Net Neutrality: Why It Matters” da Electronic Frontier Foundation (https://www.eff.org/issues/net-neutrality). Para entender melhor o debate nos Estados Unidos, sugiro o relatório “The Fate of Net Neutrality Under the Trump Administration” do Brookings Institute (https://www.brookings.edu/research/the-fate-of-net-neutrality-under-the-trump-administration/).
