De perfil liberal, Guedes defendeu reformas, cortou gastos e colecionou declarações polêmicas ao longo do mandato. Lista inclui domésticas na Disney e frase sobre governo atual ‘roubar menos’. O ministro Paulo Guedes durante entrevista coletiva em outubro de 2022
Ueslei Marcelino/Reuters
A gestão do ministro Paulo Guedes à frente do Ministério da Economia chega ao fim em 20 dias, quando termina o governo Jair Bolsonaro (PL) e começa o governo do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Nesta sexta (9), Lula anunciou o desmembramento do Ministério da Economia e a recriação do Ministério da Fazenda. Essa pasta será comandada pelo ex-prefeito de São Paulo e ex-ministro da Educação Fernando Haddad (PT).
Guedes, de perfil liberal, começou o governo Bolsonaro com status de superministro e concentrou poderes.
Além da Fazenda, ele ficou responsável pela antigas pastas do Planejamento, da Indústria e Comércio Exterior e do Trabalho e Previdência. Posteriormente, a pasta do Trabalho e Previdência saiu de seu domínio.
Ficou conhecido como o “posto Ipiranga” de Bolsonaro, em referência à influência que tinha sobre o presidente.
A gestão de Guedes ficou conhecida pela defesa de um Estado enxuto, corte de gastos e embates com a área política do governo Bolsonaro.
Ele também ganhou as manchetes em razão de frases polêmicas. Relembre as principais:
Fies para o filho do porteiro
Em abril de 2021, Guedes classificou o Fies, programa de financiamento estudantil, como “bolsa para todo mundo” e “um desastre”.
“O porteiro do meu prédio virou pra mim e falou: ‘Eu tô muito preocupado’. Eu disse: ‘O que houve?’ Ele disse: ‘Meu filho passou na universidade’. Eu: ‘Ué, mas você não tá feliz por quê? Ele: ‘[Meu filho] tirou 0 na prova. Tirou 0 em todas as provas. Recebi um negócio financiado escrito ‘parabéns seu filho tirou…’ Aí tinha um espaço pra preencher… e lá 0. Seu filho tirou 0 e acaba de se ingressar na nossa escola. Estamos muito felizes.”
Dólar a R$ 5 ‘se eu fizer muita besteira’
Em março de 2020, quando o dólar chegou a R$ 4,60, Guedes afirmou que a moeda americana ultrapassaria os R$ 5 se ele fizesse “muita besteira”.
“Eu estou dizendo que é um câmbio que flutua, se eu fizer muita besteira, ele pode ir para esse nível [R$ 5]. Se eu fizer muita coisa certa, ele pode descer”.
A moeda bateu esse patamar no mês seguinte e, entre maio de 2020 e novembro deste ano, a média mensal da cotação só caiu abaixo dos R$ 5 em um único mês (maio de 2022).
Domésticas na Disney: ‘uma festa danada’
Em fevereiro de 2020, Guedes afirmou que o dólar baixo em governos anteriores fazia com que empregadas domésticas pudessem ir à Disney, nos Estados Unidos. E que, com o dólar mais alto, turistas viriam para o Brasil.
“”Não tem negócio de câmbio a R$ 1,80. Vou exportar menos, substituição de importações, turismo, todo mundo indo para a Disneylândia. Empregada doméstica indo pra Disneylândia, uma festa danada”, criticou.
Guedes diz que com dólar baixo até ‘doméstica estava indo para Disney’
‘Não adianta ficar sentado chorando’
Ao comentar um novo aumento nas contas de luz em 2021 motivado pela crise hídrica, Guedes disse que era preciso “enfrentar” o preço, e não “ficar sentado chorando”.
“Temos de enfrentar a crise. Vamos ter de subir a bandeira, a bandeira vai subir. Vou pedir aos governadores para não subir automaticamente [o ICMS da energia elétrica], eles acabam faturando em cima da crise. Temos de enfrentar, não adianta ficar sentado chorando”, declarou.
Banco do Brasil: ‘Vender essa porra logo’
Na fatídica reunião ministerial de 22 de abril de 2020, usada em uma troca de acusações entre Bolsonaro e o ex-ministro Sergio Moro, Paulo Guedes foi filmado fazendo duras críticas à gestão do Banco do Brasil.
“O senhor já notou que o BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] e a Caixa, que são nossos, públicos, a gente faz o que a gente quer. Banco do Brasil, a gente não consegue fazer nada e tem um liberal lá. Então, tem que vender essa porra logo”, disse.
Jogos de azar: ‘Deixa cada um se foder’
Na mesma reunião, Guedes voltou ao vocabulário de baixo calão ao defender a liberação dos jogos de azar para estimular o turismo no Brasil.
“Aquilo [jogo de azar] não atrapalha ninguém. Deixa cada um se foder. Ô Damares. […] O presidente, o presidente fala em liberdade. Deixa cada um se foder do jeito que quiser. Principalmente se o cara é maior, vacinado e bilionário. Deixa o cara se foder, pô! Não tem … lá não entra nenhum, lá não entra nenhum brasileirinho. Não entra nenhum brasileirinho desprotegido. Entendeu?”, disse.
Ofensas à mulher de Macron
Em 2019, Guedes usou uma palestra em Fortaleza para defender as ofensas proferidas por Jair Bolsonaro à primeira-dama da França, Brigitte Macron. Para isso, repetiu os comentários machistas sobre a francesa.
“A preocupação é assim: xingaram a [Michele] Bachelet, xingaram a mulher do Macron , chamaram a mulher de feia. […] Tudo bem, é divertido, não tem problema nenhum. É tudo normal e é tudo verdade. Presidente falou mesmo, e é verdade mesmo, a mulher é feia mesmo [sorri, e a plateia ri e aplaude] . Não existe mulher feia, existe mulher observada do ângulo errado”.
Paulo Guedes ofende mulher do presidente francês Emmanuel Macron
‘Tchutchuca é a mãe’
Em 2019, enquanto apresentava a proposta de Reforma da Previdência em uma audiência pública na Câmara, Guedes se envolveu em bate-boca com o deputado Zeca Dirceu (PT-PR) – que chamou o ministro de “tigrão” em relação aos aposentados”, mas “tchutchuca” para a “turma mais privilegiada”.
Fora do microfone, Paulo Guedes se dirigiu a Zeca Dirceu e respondeu: “Você não falte com o respeito comigo. Tchutchuca é a mãe, tchutchuca é a vó”.
Funcionário público ‘parasita’
Guedes comparou funcionários públicos a “parasitas” ao defender, em 2020, a proposta do governo de reforma administrativa.
“O hospedeiro está morrendo, o cara virou um parasita, o dinheiro não chega no povo e ele quer aumento automático”, declarou.
Paulo Guedes compara funcionário público a ‘parasita’
‘Não se assustem se alguém pedir o AI-5’
Em 2019, enquanto aliados do governo davam declarações insinuando uma eventual ruptura democrática, Guedes disse a jornalistas que “não se assustassem” caso alguém pedisse o AI-5 – ato mais duro da ditadura brasileira que, em 1968, levou à censura e à tortura de opositores dos militares.
“É irresponsável chamar alguém pra rua agora pra fazer quebradeira. Pra dizer que tem que tomar o poder. Se você acredita numa democracia, quem acredita numa democracia espera vencer e ser eleito. Não chama ninguém pra quebrar nada na rua. Ou democracia é só quando o seu lado ganha? Quando o outro lado ganha, com dez meses você já chama todo mundo pra quebrar a rua? Que responsabilidade é essa? Não se assustem então se alguém pedir o AI-5. Já não aconteceu uma vez? Ou foi diferente?”, disse.
‘Vírus chinês’ e vacina menos efetiva
Em 2021, Guedes reuniu várias teorias da conspiração e fake news ao afirmar, em reunião do Conselho de Saúde Suplementar, que os chineses tinham inventado o vírus da Covid e que produziam vacinas menos efetivas que as dos laboratórios norte-americanos.
“O chinês inventou o vírus, e a vacina dele é menos efetiva do que a americana. O americano tem 100 anos de investimento em pesquisa. Então, os caras falam: ‘Qual é o vírus? É esse? Tá bom, decodifica’. Tá aqui a vacina da Pfizer. É melhor do que as outras”, disse.
Prato brasileiro x prato europeu
Em 2021, ao defender que alimentos desperdiçados fossem encaminhados a projetos sociais, Guedes comparou o almoço dos brasileiros, onde haveria “uma sobra enorme”, com o prato do europeu que “já enfrentou duas guerras mundiais”.
“Você vê um prato de um [cidadão] classe média europeu, que já enfrentou duas guerras mundiais, são pratos relativamente pequenos. E os nossos aqui, fazemos almoços onde às vezes há uma sobra enorme. E isso vai até o final, que é a refeição da classe média alta. Até lá, há excessos”, disse o ministro da Economia.
Acusações contra França e Bélgica
Em 2022, durante o Fórum Econômico Mundial de Davos, Guedes acusou França e Bélgica de atuarem para retardar o ingresso do Brasil na OCDE, um “clube dos países ricos”.
“A Bélgica e a França ficam retardando o acesso do Brasil à OCDE porque são protecionistas com sua agricultura. Conversando com eles dissemos: ‘Nos aceitem antes que se tornem irrelevantes para nós'”, disse.
‘FMI tem de falar menos besteira’
Em outra viagem ao exterior, em outubro, Guedes atacou o Fundo Monetário Internacional (FMI) e disse que a instituição deveria “falar menos besteira”.
“Há seis meses, estava todo mundo dizendo que os brasileiros estão passando fome. Aí o FMI diz que o gasto podia ser menor. Isso que eu falo: o FMI tem que falar menos besteira e trabalhar um pouco mais pra alertar os americanos, os europeus.”
Ministro nega fome no Brasil
Sem apresentar dado contrário e em meio à campanha frustrada de reeleição de Jair Bolsonaro (PL), Guedes afirmou em setembro que era mentira o dado de que 33 milhões de pessoas passam fome no Brasil.
“33 milhões de pessoas passando fome é mentira. Nós estamos transferindo para os mais pobres, com o Auxílio Brasil, 1,5% do PIB, três vezes mais do que recebiam antes”, declarou.
‘Nós roubamos menos’
No mês seguinte, enquanto Lula e Bolsonaro disputavam o segundo turno presidencial, Guedes cometeu um ato falho ao dizer que o governo atual “rouba menos” que as gestões petistas.
“Eu, se fosse o Bolsonaro, diria: tudo o que o Lula fizer, eu faço mais. Por quê? Porque nós roubamos menos”, afirmou. E se corrigiu imediatamente em seguida: “Nós não roubamos”.
‘Cala a boca, vai trabalhar’, diz a Lula
Passado o segundo turno, Guedes atacou o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao dizer que o político deveria “calar a boca” e “ir trabalhar”.
“Já ganhou, cala a boca, vai trabalhar, vai construir um negócio melhor, porque o desafio é grande”, disse.
VÍDEOS: notícias sobre economia