Resenha de espetáculo musical de teatro
Direção: Isabel Teixeira
Banda: Alfredo Castro (voz e percussão), Gustavo de Medeiros (voz e violão), Vitor Casagrande (voz, cavaquinho e bandolim) e Xeina Barros (voz e percussão)
Local: Teatro Paulo Eiró (Santo Amaro – São Paulo, SP)
Data: 22 de outubro de 2022
Cotação: ★ ★ ★ ★
♪ Espetáculo em cartaz de 27 a 30 de outubro de 2022 no Teatro João Caetano (Vila Clementino – São Paulo, SP)
♪ SÃO PAULO – Uma das mais expressivas atriz da cena brasileira, com 55 anos de atividade profissional nos palcos e telas, Regina Braga é mineira de Belo Horizonte (MG) abrigada na cidade de São Paulo (SP) desde os anos 1960.
Até por conta dessa rota migratória, comum nas vidas de milhões de brasileiros, a biografia da artista a legitima como protagonista de São Paulo, espetáculo em que Braga segue roteiro afetivo, histórico e musical ao mapear os caminhos da maior cidade do país desde a fundação em 25 de janeiro de 1554.
Em cartaz por teatros paulistanos desde 28 de janeiro, seguindo atualmente circuito popular, São Paulo junta a atriz com banda que, na apresentação de 22 de outubro no Teatro Paulo Eiró, era formada por Alfredo Castro (voz e percussão), Gustavo de Medeiros (voz e violão), Vitor Casagrande (voz, cavaquinho e bandolim) e Xeina Barros (voz e percussão).
Sob a direção delicada da também atriz Isabel Teixeira, Regina Braga põe a voz a serviço de roteiro musical que parte do samba – precisamente do samba sintomaticamente intitulado Raiz (1979), do compositor Paulo Vanzolini (1924 – 2013), dono de cancioneiro primordialmente identificado com São Paulo – até chegar nas dissonâncias ainda modernas de Itamar Assumpção (1949 – 2003). De Itamar, a atriz aborda Persigo São Paulo (2010) em número pautado pela densidade da interpretação no clímax do espetáculo.
Sem a pretensão de se colocar em cena como cantora, Regina Braga solta a voz pequena como grande atriz que é – e, por isso mesmo, compensa a ausência de musicalidade e suingue sobressalentes com a precisão das interpretações, acertando sempre o sentido das letras de músicas como Alta noite (Arnaldo Antunes, 1993).
Entre uma música e outra, a atriz interpreta textos de diversos autores que traduziram São Paulo. São textos de nomes como o padre jesuíta José Anchieta (1534 – 1597), o poeta e escritor Mário de Andrade (1893 – 1945), o médico e escritor Drauzio Varella e o escritor Plínio Marcos (1935 – 1999), de quem Regina ficou amiga quando começou a frequentar o meio teatral paulistano, ainda como estudante de arte dramática, nos anos 1960.
Regina Braga na cena de ‘São Paulo’, espetáculo feito pela atriz com quatro músicos — Foto: Roberto Setton / Divulgação
A propósito, os relatos pessoais da atriz – no início e sobretudo no fim do espetáculo – aproximam o espectador da cena, potencializando a emoção do relato. É quando a atriz se desnuda no palco, deixando transparecer a paixão pela cidade, matéria-prima das músicas e dos textos de São Paulo.
Posicionado em mesa ao centro da cena, o quarteto de músicos toca, canta e interage com a atriz, como se essa mesa estivesse em um bar da cidade em que a trilha sonora é apresentada sem formalismos, exibicionismos e obviedades.
Uma das mais completas traduções musicais de São Paulo (SP), a obra do compositor Adoniran Barbosa (1910 – 1982) é recorrente no roteiro assinado por Regina Braga com colaborações dos músicos. Ainda assim, em vez de standards até justificáveis como Saudosa maloca (1955) e Trem das onze (1964), a atriz optou por sambas como Abrigo de vagabundos (1958) e Aguenta a mão, João (Adoniran Barbosa e Hervê Cordovil, 1971).
Tanto os sambas como as impressões pessoais da atriz humanizam o painel histórico montado através do encadeamento dos textos e músicas de espetáculo que se alimenta de todas as coisas que, em 2022, ainda acontecem no coração daquela ex-estudante mineira de teatro – deslumbrada ao descobrir que morava no mesmo pensionato de atrizes como Dina Sfat (1938 – 1989) e Isabel Ribeiro (1941 – 1990) – quando Regina Braga fala do amor por São Paulo.