Nas profundezas da região de Garhwal, em Uttarakhand, norte da Índia, pulsa um coração cultural vibrante, onde a tradição e a fé se entrelaçam em uma dança milenar. É o Ramman Utsav, um festival que transcende a mera celebração, tornando-se um espetáculo sagrado de ritual, teatro e devoção. Reconhecido pela UNESCO como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade, o Ramman Utsav é uma janela para a alma de um povo, uma expressão viva de sua história, crenças e identidade.
Um Mosaico de Cores, Ritmos e Histórias
Imagine o ar impregnado pelo som dos tambores, enquanto artistas mascarados se movem em um ritmo hipnotizante, suas vestimentas vibrantes explodindo em tons de escarlate, açafrão, ouro e esmeralda sob a luz do sol. Os sons profundos ecoam pelas montanhas, pulsando pelos campos verdejantes de Saloor Dungra, uma pequena vila aninhada no coração de Uttarakhand. O Ramman Utsav se revela como um espetáculo que mistura rituais comunitários, folclore tradicional, procissões com divindades locais, peças míticas e músicas e danças étnicas.
Acredita-se que o festival tenha suas raízes no século VIII, quando Shri Adi Shankaracharya chegou à região e estabeleceu Jyotirmath e Anirmath. O Ramman Utsav é considerado um desdobramento do Movimento Bhakti, evoluindo para um teatro ritual religioso anual que retrata uma forma condensada da história de Rama (Ram Katha). Surpreendentemente, não há diálogos; apenas danças que narram o nascimento de Rama e Lakshmana, o Swayamvar de Sita, o exílio na floresta (Vanvas), a morte do Cervo Dourado, o rapto de Sita e a Incêndio de Lanka, culminando com a Coroação Final. Além disso, o festival apresenta cenas com Narasimha Devtaa, Ganesha e os Pandavas, juntamente com danças como Gaanna Gunni Nritya, Suraj Ishwar Nritya, Ganesh Kalinkya Nritya e Pandav Nritya.
A Alma da Montanha em Movimento
Celebrado no pátio da divindade guardiã, Bhumiyal Shetrapal Devta, o Ramman Utsav cativa com sua energia vibrante e ritmo envolvente. A performance ritualística da divindade da aldeia ocupa o centro do palco, balançando-se em um movimento semelhante a um transe que ecoa o batimento cardíaco da terra. As cores deslumbrantes, os cânticos elevados e a atmosfera carregada de reverência demonstram que o Ramman Utsav é mais do que um festival: é uma comunhão com o divino, realizada por uma comunidade que demonstra sua fé em cada batida e respiração.
Máscaras e Mistérios: A Arte da Tradição
As máscaras do Ramman Utsav são um elemento integral do festival, confeccionadas localmente pelos moradores com madeira de Bhojpatra (bétula do Himalaia) e Kemu (amoreira). Existem mais de 18 máscaras, algumas pesando até 25 kg, como a de Narasin Devtaa, que são reverenciadas e adoradas antes do festival. As máscaras dançam no templo antes do festival, invocando as divindades, enquanto a maquiagem, feita com corantes naturais, açafrão e mel, confere identidade aos personagens.
Um Espetáculo de Música, Dança e Devoção
Os cânticos e canções são divinos, acompanhados por uma variedade de instrumentos musicais, como os tambores Dhol e Damau, Jhanhjar e Manjira (címbalos) e trombetas chamadas Bhankara. O canto e a cantoria são realizados pelos bardos tradicionais. Toda a performance é coreografada em 18 Taals, cada um representando uma dança e uma cena específicas do Ramayana. Cada batida é fixa, até mesmo para performances específicas, com um morador local registrando cada detalhe.
O Ramman Utsav é uma celebração da vida em sua totalidade, unindo o sagrado e o secular, o individual e o comunitário. É um testemunho da resiliência cultural de um povo que, apesar das mudanças do tempo, continua a honrar suas tradições e a transmitir seus valores às futuras gerações. Em um mundo cada vez mais homogêneo, o Ramman Utsav se destaca como um farol de diversidade cultural, um lembrete da riqueza e beleza que reside na pluralidade de experiências humanas.
O festival é realizado anualmente em abril, por cerca de 15 dias, culminando em um grandioso espetáculo. O Ramman Utsav não é apenas uma performance; é uma experiência transformadora, que nos convida a refletir sobre nossa própria identidade cultural e sobre a importância de preservar e celebrar as tradições que nos unem.
 
				 
															
