Agente Victor Hugo de Oliveira Castro enviou dados de em grupo não oficial de policiais no aplicativo. MPF também determinou abertura de inquérito para apurar possível crime de violação de sigilo funcional.
Troca de mensagens entre os policiais rodoviários federais no grupo do Telegram
Reprodução/Telegram
A Polícia Rodoviária Federal (PRF) abriu uma investigação administrativa para apurar a divulgação de dados pessoais de uma mulher transexual em um grupo não oficial de servidores da corporação no Telegram, com aproximadamente 870 membros.
O servidor Victor Hugo de Oliveira Castro enviou no grupo, chamado “Firma Curva do Rio”, informações particulares sobre a cabeleireira Daniela Rodrigo, de 38 anos, sem consentimento.
Ao g1, ele admitiu que obteve os dados por meio do trabalho na PRF e alegou que queria apenas fazer uma “brincadeira” com um amigo.
O Ministério Público Federal (MPF) em Bragança Paulista (SP) também determinou a abertura de um inquérito policial para apurar o caso.
A situação ocorreu no dia 19 de abril, quando um usuário não identificado chamado “Kermit The Frog” enviou um print de WhatsApp ao grupo do Telegram pedindo ajuda para identifica um motorista que, supostamente, teria estacionado um carro em uma vaga residencial errada (veja acima).
O print tinha a foto da placa do veículo e a mensagem: “Boa tarde, alguém consegue os dados dessa caminhonete, está na minha vaga de garagem desde ontem, nem o síndico conseguiu identificar de qual apartamento é!”.
Envio de dados pessoais
Em menos de dez minutos, o PRF Victor Hugo de Oliveira Castro, que trabalha no município de Atibaia (SP), respondeu que havia localizado a condutora.
Ele enviou uma foto dos dados da cabeleireira Daniela Rodrigo, que trabalha em Cerquilho, no interior de São Paulo. A imagem tinha o nome de registro dela, o nome completo da mãe, os oito dígitos do CPF e o número de registro da CNH.
Ao saber da divulgação dos dados, Daniela afirmou ao g1 que não tinha relação com o veículo e que usaram a imagem dela sem permissão. No dia 6 de maio, ela registrou um boletim de ocorrência sobre o caso.
“Não faço ideia de quem é esse carro. De repente, é uma coisa grave e eu não estou sabendo”, afirmou.
“Eu tive que correr atrás do prejuízo porque eu não quero nenhum problema para mim. Imagine se eles usam minha imagem para outra coisa, algum tipo de assalto, ou se me acusarem de qualquer outra coisa. Imagine se esse carro for roubado ou se o motorista causar um acidente e acharem que fui eu”, declarou.
O que diz o policial
O PRF Vitor Castro também confirmou ao g1 que enviou as informações e que Daniela não tem relação com o carro.
O policial disse que tinha os dados da cabeleireira salvos porque trabalha procurando fraudes na emissão de carteiras, e que analisou os dados de Daniela, mas não houve qualquer irregularidade. Há cerca de seis anos, ela emitiu uma nova CNH, quando passou a se identificar como uma pessoa trans.
Os dados enviados pelo PRF no grupo são do documento anterior, em que aparece o nome de registro com o qual ela não se identifica mais. Vitor Castro alega que mandou a imagem para fazer uma “brincadeira”, mas não explicou por que escolheu os dados da cabeleireira.
“Foi uma brincadeira com o meu amigo. A única coisa que eu fiz foi brincar com um amigo meu. A foto já estava no meu celular por um motivo profissional, eu só aproveitei. Não fiquei procurando, não invadi o sistema [da PRF] para procurar os dados de ninguém, não fiz nada fora da lei […] [Eu] não tive o intuito de denegrir a imagem de ninguém, nem usar a imagem para causar dano a essa pessoa num grupo fechado onde só tem PRF. Não era para ter vazado de lá”, afirmou o policial.
Possíveis crimes
A Polícia Rodoviária Federal declarou apenas que está realizando uma investigação administrativa sobre o caso, mas não detalhou quem são os investigados.
O procurador da República de Bragança Paulista, Ricardo Nakahira, por sua vez, emitiu um ofício – ao qual o g1 teve acesso – declarando a abertura de uma investigação para apurar se o policial cometeu o crime de violação de sigilo profissional.
Esse delito ocorre quando um funcionário público, por conta das funções profissionais, tem acesso a informações e as revela a terceiros.
O crime está previsto no artigo 325 do Código Penal, que prevê pena de detenção de seis meses a dois anos, ou multa.
Para o advogado Henrique Rocha, sócio da Peck Advogados, o policial também pode ter cometido outros crimes, como:
Desvio de finalidade – ter salvo os dados de Daniela obtidos com objetivo profissional e ter divulgado em um grupo de PRFs;
Injúria – se a intenção da mensagem enviada pelo policial tiver algum cunho transfóbico;
Danos de ordem civil – quando uma pessoa prejudica terceiros
O PRF Vitor Castro disse ao g1 que teve ciência de que a divulgação dos dados de Daniela está sendo investigada, mas, até o momento, não foi procurado para responder sobre o assunto.
“Firma Curva do Rio”
Na descrição do grupo de PRFs onde o conteúdo foi divulgado, os administradores dizem – num tom de brincadeira – que existem regras para os integrantes, como:
Art. 1º- O grupo foi feito, basicamente, para criar desavenças, intrigas e destruir a autoestima dos integrantes;
Art. 2º- Sempre que possível, colocar em xeque a masculinidade e/ou a feminilidade dos participantes;
Art. 3º- Execrar participantes com posições políticas que não estejam de acordo com a maioria do grupo;
Art. 4º- Também é permitido humilhar, ridicularizar, xingar e se utilizar do pior linguajar possível, mas sempre mantendo o respeito;
Art 5º- É permitido sair na porrada, desde que seja filmado e postado no grupo. Os que o fizerem, ganharão o respeito dos demais;
Art. 6º- O bullying é altamente incentivado, principalmente em relação à feiúra e forma física dos participantes, seus hábitos alimentares, vícios e etc.
Art. 7º – É proibido elogiar demasiadamente, serão considerados um casal;
Art. 8º – Quando o assunto for sério, toda a humilhação e xingamentos deverão ser imediatamente interrompidos. Depois devem voltar.
Art. 9º – Ninguém sai!
Parágrafo único – depois de entrar, se sair já sabe que estará confessando que é corno, traveco, trans, sapata e afins.
Art. 10 – O grupo será formado, exclusivamente, por FDP maneiros, e qualquer mágoa residual será resolvida com um chopp nos encontros da turma.
Art. 11 – Todos, sem exceção, devem pagar as suas respectivas contas, no que se refere ao artigo 10.
Art. 12 – Todo integrante deverá execrar até a vergonha máxima todos petistas e bolsominions (estes últimos mais ainda, por razões óbvias).
Art. 13 – Não será tolerado serrotes.
Art. 14 – Nenhuma mensagem, mídia ou documento postado no grupo poderá ser usado para mover processos ou embasar denúncias de qualquer espécie.
Parágrafo único. Prints também não tem qualquer valor, exceto de servir para execrarmos o X9 maldito.
Art. 15 – Quem falar mal:
I – do Bolsonaro, será sumariamente considerado comunista.
II – do Lula, será sumariamente considerado fascista.
III – do Bolsonaro e do Lula, será sumariamente considerado isentão.
Parágrafo único. Quem não falar mal do Bolsonaro nem do Lula, será sumariamente considerado broxa.
Após ser procurado pelo g1, Castro enviou a seguinte mensagem ao grupo: “Até onde eu sei, já levantaram prints de um monte de mensagens xenofóbicas, racistas e homofóbicas do grupo, como se isso fosse para ser levado a sério […] Então não sou só eu que serei chamado a dar explicações. Quem tiver couro fino, a hora de pular do barco é agora”.
O g1 tentou entrar em contato com o administrador do grupo, mas não teve retorno até a publicação desta matéria.
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