Parlamento do Peru rejeita antecipar eleições, e protestos aumentam


Dezoito pessoas já morreram em manifestações que pedem a libertação do ex-presidente Pedro Castillo, que foi destituído e preso após tentar dar um golpe de estado há duas semanas. Apoiadora de Castillo protesta na rua com bandeira do Peru na frente de batalhão policial
Martin Mejia/AP
A antecipação das eleições no Peru, uma tentativa de conter a crise provocada pela prisão do ex-presidente Pedro Castillo, fracassou nesta sexta-feira (16), em meio a protestos violentos que deixaram milhares de turistas retidos em Cusco e Machu Picchu.
As manifestações já deixaram 18 mortos e mais de 500 feridos, a maioria após confrontos com militares em um cenário de estado de emergência nacional.
Os manifestantes pedem a libertação de Castillo, a renúncia de sua sucessora constitucional, a ex-vice-presidente Dina Boluarte, o fechamento do Parlamento e eleições gerais imediatas.
Na sexta-feira (16), o Parlamento peruano rejeitou uma proposta de Boluarte para antecipar as eleições de 2026 para 2023. A iniciativa permitiria a convocação de eleições para dezembro de 2023 e a saída do poder de Boluarte apenas em abril de 2024. Os parlamentares querem que Boluarte deixe já o poder.
“O que virá é a renúncia de Dina Boluarte, que dará vez a uma transição democrática”, afirmou a congressista de esquerda Ruth Luque. “Pela quantidade de peruanos mortos, a senhora Boluarte deveria renunciar”, disse a congressista de centro Susel Paredes.
No caso da renúncia de Boluarte, a lei peruana indica que o sucessor deve ser o presidente do Congresso, José Williams. Caso ele também desista, o cargo seria assumido pela presidente da Suprema Corte, Elvia Barrios, que teria a responsabilidade de convocar novas eleições.
Cinco mil turistas retidos em Cusco
Boluarte, acompanhada da chanceler peruana, Cecilia Gervasi, teve “uma conversa por telefone com o secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken” na sexta-feira, de acordo com um comunicado do Ministério das Relações Exteriores do Peru.
Durante o diálogo, os EUA reiteraram o apoio ao Peru “e sua vontade de seguir fortalecendo a extensa relação bilateral”.
O fechamento de estradas e aeroportos interrompeu o trânsito de turistas na cidade andina de Cusco, capital turística do país, na madrugada desta sexta-feira. “Há 5 mil turistas retidos na cidade de Cusco, eles estão em seus hotéis esperando que os voos sejam reativados”, declarou Darwin Baca, prefeito do distrito vizinho de Machu Picchu.
Um helicóptero do exército chegará neste sábado (17) ao distrito de Machu Picchu para transferir em quatro voos mais de 500 turistas estrangeiros que se encontram retidos, informaram as autoridades locais.
O aeroporto internacional de Cusco ficou fechado desde segunda-feira (12), após uma tentativa de ocupação por manifestantes.
No entanto, na sexta-feira, o Ministério da Defesa anunciou sua reabertura. “Estamos esperando que eles nos coloquem em um voo humanitário para que possamos chegar a Lima e ir à Argentina para ver a família da minha esposa”, contou um turista espanhol ao canal local N.
Preso em flagrante
Enquanto isso, da cidadela inca de Machu Picchu, cerca de 200 turistas, principalmente americanos e europeus, caminharam pela ferrovia até a cidade de Ollantaytambo, a cerca de 30 km de distância, para poder pegar uma conexão para Cusco. O trem de turistas, cujo serviço está suspenso, normalmente percorre este percurso.
As manifestações no país começaram depois que Castillo, um professor rural de esquerda e de origem humilde, tentou dar um autogolpe em 7 de dezembro, dissolver o Parlamento, intervir nos poderes públicos e governar por decreto.
Ele foi preso “em flagrante” quando tentava chegar à embaixada mexicana para pedir asilo. O tribunal decidiu na quinta-feira (15) que ele permanecerá preso por 18 meses, até junho de 2024, para ser investigado por rebelião. Há também uma denúncia constitucional inédita apresentada pelo Ministério Público contra Castillo por corrupção.
Os protestos têm sido mais intensos no sul andino do Peru, região assolada pela pobreza e com fortes reivindicações sociais. Na quinta-feira, uma tentativa de tomada do aeroporto de Ayacucho (sul) foi contida pelo Exército.
“Em Ayacucho temos oito mortes em um dia de manifestações e confrontos com o Exército”, informou a Defensora do Povo, Eliana Revollar, acrescentando que os manifestantes carregavam estilingues e pedras. “Essas pessoas morreram devido atingidas por tiros”, acrescentou.
Crianças entre os mortos
O número de mortos desde o início dos protestos em 7 de dezembro aumentou para 18, disse a ministra da Saúde, Rosa Gutiérrez, nesta sexta-feira. Entre eles há dois menores de idade. O Comitê dos Direitos da Criança da ONU instou o Peru a investigar as mortes dos menores.
Além disso, foram registradas outras seis mortes por eventos relacionados a bloqueios de estradas, como atropelamentos ou mortes de pessoas doentes – incluindo menores – que não conseguiram chegar a tempo a um hospital.
De acordo com a Defensoria do Povo, também há 518 feridos, sendo 250 civis e 268 policiais. Organizações de direitos humanos relataram 147 detidos.
Boluarte condenou “os atos de vandalismo de alguns radicais que usam a boa vontade do povo”. “Isso precisa parar”, disse a presidente nesta sexta-feira, durante uma cerimônia militar.
Em protesto pela morte de manifestantes, a ministra da Educação, Patrícia Correa, e o ministro da Cultura, Jair Pérez, entregaram seus cargos nesta sexta-feira.

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