O que muda com o projeto de lei que permite produtores rurais fiscalizarem as suas próprias fazendas


Conhecida por PL do autocontrole, legislação ainda precisa ser sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro para começar a valer. Projeto de lei pode permitir que produtores rurais fiscalizem as suas próprias fazendas.
Aderr/Divulgação/Arquivo
Um projeto de lei aprovado pelo Senado na noite de terça-feira (20) vai permitir que os próprios agricultores e pecuaristas fiscalizem a sua produção de alimentos e criação de animais.
Essas atividades são, hoje, exercidas exclusivamente por fiscais do Ministério da Agricultura.
O texto, que ficou conhecido como PL do Autocontrole, já passou pela Câmara dos Deputados e segue, agora, para a sanção presidencial.
A nova legislação abrange ainda o monitoramento da compra de matérias-primas, como fertilizantes e agrotóxicos, até o envio do produto para a venda.
Ambientalistas afirmam que a proposta diminui o rigor na fiscalização, colocando em risco a segurança dos alimentos e o bem-estar animal.
Como é a fiscalização hoje
Fiscais do Ministério da Agricultura são responsáveis por monitorar e controlar toda a aplicação das normas sanitárias e de bem-estar animal em toda a indústria agropecuária, tanto para o consumo interno quanto para exportação;
Em empresas maiores, como nos grandes frigoríficos, há fiscais todos os dias para averiguar se todos os procedimentos estão acontecendo corretamente, explica Macedo, da Anffa. Empresas menores recebem visitas de tempos em tempos;
Caso os fiscais identifiquem algum tipo de irregularidade, diversas ações podem ser tomadas, desde advertência e multas ao fechamento do estabelecimento;
São os fiscais do Ministério da Agricultura que decidem sobre a aplicação das advertências, multas e fechamentos.
Como pode ficar
Caso o projeto de lei seja sancionado pelo atual presidente Jair Bolsonaro:
As empresas serão responsáveis por criarem os seus próprios programas de fiscalização e contratarem profissionais para monitorarem a produção de alimentos, a criação e a saúde dos animais, além da compra de matérias-primas, como agrotóxicos;
O Ministério da Agricultura poderá credenciar empresas ou pessoas físicas para a prestarem serviços técnicos ou operacionais relacionados às atividades de defesa agropecuária;
Caberá ao governo fiscalizar o andamento desses programas – a forma como isso será feito e o papel dos fiscais públicos ainda não foram detalhados, diz Macedo;
Entre as informações a serem prestadas pelas empresas, estão registros de toda a produção, desde à compra e a recebimento da matéria-prima até o envio do produto para a venda.
Pequenos agricultores não serão obrigados a aderirem a autofiscalização;
O Ministério da Agricultura vai continuar decidindo sobre as multas, mas as empresas vão poder recorrer a uma comissão formada pelo próprio Ministério da Agricultura, Ministério da Justiça e Segurança Pública, Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Críticas de ambientalistas
Entidades ligadas ao meio ambiente e à defesa dos animais criticaram a proposta e afirmam que ela diminui o rigor na fiscalização dos produtos da agricultura e da pecuária.
“Permitir que um vendedor seja o responsável por atestar a conformidade legal da sua própria mercadoria é algo esdrúxulo sob qualquer ótica”, afirmou Kenzo Jucá, assessor Legislativo do Instituto Socioambiental.
“Quando se trata de alimentos é algo completamente inaceitável e ameaçaria a segurança sanitária de toda sociedade”, afirmou Jucá.
“O povo brasileiro tem o direito que o Estado garanta a proteção adequada aos animais e à saúde pública”, disse a diretora-executiva da Animal Equality, Carla Lettieri.
Uma das consequências de um possível enfraquecimento da fiscalização é o aumento do maltrato aos animais no setor, como gado e galinhas, diz ela.
A diretora executiva do Animal Equality lembra de um levantamento realizado pela organização em que foi apurada a situação em alguns abatedouros no país. “São verdadeiras cenas de filmes de terror”, afirma.
“Animais sendo chutados, sendo cortados vivos, a insensibilização feita de uma maneira extremamente violenta e de forma ineficaz, ou seja, o animal é morto ainda consciente”, relata Carla.
Para ela, uma queda na fiscalização permitirá que os abates sejam feitos “da pior forma possível”. “É uma exceção hoje, mas muito provavelmente será uma regra no futuro”, alega.
Além dos animais, o meio ambiente de forma geral poderia ser prejudicado, afirma. Isso porque os fiscais do governo também monitoram a utilização de agrotóxicos nas lavouras, bem como a entrada de químicos no país.
Segundo a diretora executiva, o PL poderia causar o uso indiscriminado desses defensivos e fertilizantes, além de aumentar a entrada dos produtos fraudulentos.

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