Luedji Luna usa um verso de “Um Corpo No Mundo”, música que dá título ao álbum de estreia, para dizer que é “extremamente cansativo você ser a sua própria embarcação”.
“Às vezes você quer ter um motor ali empurrando seu barquinho, você quer ter alguém ali para que reme com você. É cansativo você ser a sua única investidora sempre”.
Os desabafos e os bastidores de artistas que tocam e investem sozinhos nas próprias carreiras são o tema do podcast g1 ouviu abaixo.
Além do podcast, o g1 publica nesta semana uma série de entrevistas com Luedji, Johnny Hooker Luedji e Luna e Karina Buhr sobre a realidade da cena dos artistas independentes na MPB.
Na sequência, Luedji dá como exemplo todos os custos recentes que teve para realizar uma turnê internacional, como visto, passagem, preço do dólar… Tudo isso sem entrar na correria para fazer a carreira virar aqui dentro do Brasil mesmo.
“Estou nos festivais, tenho público, tenho seguidores, mas que não chega a um milhão, meus shows dão sold out, minha carreira é respeitada pela crítica. Isso não é o suficiente para eu ter esse motor?”.
Ela foi indicada ao Grammy Latino com o álbum “Bom Mesmo é Estar Debaixo D’água” e cantou na premiação em Las Vegas no ano passado. Ela lança em novembro uma edição deluxe do disco, com 10 músicas inéditas e 4 de remixes.
Capa do álbum ‘Bom mesmo é estar debaixo d’água’, de Luedji Luna — Foto: Peu Fernandes
“Enquanto eu estou fazendo aqui com mil, tem gente com 100 milhões que consegue mais milhões ainda para se realizar e o artista independente nunca consegue”.
“A gente não pode entrar no mérito das qualidades artísticas, mas também não pode tirar o mérito de que esse artista independente está fazendo algo caro, rico e de qualidade para música brasileira”.
Assim como Johnny Hooker, Luedji reinveste tudo que ganha na própria carreira. Ela que viabiliza os clipes, as turnês e as gravações desde que mudou para São Paulo para correr atrás do sonho de viver da música há pouco mais de 5 anos.
Ela conta que o máximo que já gastou em um clipe foi R$ 35 mil, fazendo esforços e abrindo mão de pontos importantes para o orçamento fechar. Para fazer confortável, precisaria de R$ 100 mil.
Reservada, Luedji Luna entendeu que é preciso estar nas redes sociais para chamar atenção para suas músicas e shows — Foto: Reprodução/Instagram/Luedji Luna
A cantora baiana que estourou com “Banho de Folhas” em 2017 até pode estar no Instagram “dando close”, como ela mesma diz, mas não se engane. O lugar que Luedji quer estar é no estúdio, produzindo música ou cantando em cima do palco.
Além da falta de investimento externo, Luedji também percebe que o sucesso na internet se tornou, nos últimos anos, um grande balizador do que vira sucesso ou não.
“Além de ser artista, de criar, de gravar, além de fazer show, além de se cansar, ter saúde, você ainda tem que estar ali se expondo 24 horas para você ter engajamento e assim ter seguidor. A internet é a grande régua para determinar quem tem valor aqui não tem, isso é um ponto”.
Luedji Luna se apresenta, ao lado de Liniker, no Rock in Rio neste domingo (11) — Foto: Stephanie Rodrigues/g1
“Acho que é inegável o fato de ser mulher e preta isso dentro da estrutura de um país como o Brasil. Então tudo atravessa também essa questão racial”, pontua como outra característica que limita a carreira quando se pensa no quanto o Brasil ainda é um país racista e machista.
Luedji é mais reservada, mas entendeu a regra do jogo e se esforça para se fazer presente nas redes. Mas não nega: “Era muito mais legal quando eu só precisava ser cantora”.
“Posso estar no Instagram fazendo close, mas a minha cachaça é música. Gosto de produzir música, gosto de estar no estúdio, então se a música pede uma poesia, a voz de Nina Simone, por exemplo, eu não sei quanto isso vai me custar, não sei o trabalho que vai dar, mas vou atender, eu vou respeitar a canção, sabe?”
Luedji Luna no Mita Festival 2022 — Foto: Divulgação/Ariel
Mas será que ela mudaria o som para mudar de patamar? A tranquilidade e sinceridade com a qual Luedji responde a essa pergunta é um dos pontos altos da entrevista ao g1.
“Eu quero é dinheiro, sabe? Amo minha vida, meu público. Amo poder ir ao mercado, amo ter minha minha individualidade, ter minha família preservada. Tudo que tenho, eu conquistei, mas podia estar com mais dinheiro”.
Ela sente falta de um grande investidor, que poderia ser uma gravadora ou uma grande empresária ou empresário, para conseguir furar a bolha e emplacar sucessos em nível nacional ou, pelo menos, ter a tranquilidade para fazer os projetos que quer sem que tudo dependa do próprio bolso.
“Se alguém vier e falar ‘quer jogar, quer ser agressiva? Então bora jogar’, minha música pode virar um pop mesmo. É muito menos sobre o estilo musical e mais sobre a postura”.
Esse pensamento pé no chão e realista diz muito sobre a forma de encarar a música como profissão, como trabalho, como única fonte de renda mesmo.
Luedji Luna e Zudizilla com o filho Dayo — Foto: Reprodução/Instagram/LuedjiLuna
A cantora vive “com dignidade e com certa estabilidade” da música, nas palavras dela, principalmente com o que ganha nos shows. É assim que cria Dayo, seu primeiro filho com o rapper Zudizilla.
Filha de funcionários públicos, Luedji diz que essa segurança financeira sempre foi um ponto importante em casa.
É por isso que ama viver de música, é o que quer fazer “até o fim como Elza Soares”, mas não é uma aventureira.
“No dia que a música não tiver mais dando uma vida com qualidade, com dignidade, vou procurar outra coisa para fazer e vou botar minha música na internet”.
“A música não é mais importante que a minha humanidade, mas graças a Deus nós estamos muitos alinhadas e em consonância [para seguir ]”.
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