Justiça da Argentina decide que Irã esteve por trás de atentado terrorista em centro judaico em 1994, o maior da história do país


O tribunal que tomou a decisão afirmou que os crimes são graves violações aos direitos humanos e, por isso, não prescrevem e que os responsáveis podem ser julgados em qualquer lugar do mundo. Imagem do local do atentado terrorista poucos momentos após a explosão
Reuters
A Justiça da Argentina decidiu nesta quinta-feira (11) que o Irã esteve por trás do atentado de 1994 contra a sede da Associação Mutual Israelita Argentina (Amia) de Buenos Aires, em 1994, que deixou 85 mortos –é o maior atentado terrorista da história argentina (leia mais sobre o atentado abaixo).
O grupo libanês Hezbollah, que é aliado dos iranianos, foi o responsável pela execução do atentado, segundo a decisão.
“O atentado de 1994 em Buenos Aires foi organizado, planejado, financiado e executado sob a direção das autoridades do Estado Islâmico do Irã, no contexto da Jihad Islâmica, e com o envolvimento da organização política e militar Hezbollah”, afirmaram na sentença os juízes da Câmara Federal de Cassação, a instância máxima da Justiça criminal do país.
O tribunal afirmou que os crimes são graves violações aos direitos humanos e, por isso, não prescrevem e que os responsáveis podem ser julgados em qualquer lugar do mundo.
Além de determinar que o Irã esteve por trás do atentado, a Justiça também absolveu outras pessoas que, no passado, foram condenadas pelo envolvimento com o atentado.
O governo iraniano ainda não se manifestou. O atual líder máximo do Irã, Ali Khamenei, já estava nessa posição em 1994, quando houve o atentado em Buenos Aires. No entanto, o presidente era outro.
Irã dava proteção diplomática
Na decisão, os juízes discorrem sobre a natureza do terrorismo e dizem que se trata de uma tentativa de estabelecer uma guerra que não respeita fronteiras.
“É uma guerra revolucionária sem limitações espaciais ou temporais. Com o tempo, o terror como estratégia de poder não é apenas o praticado pelo Estado, mas também empregado contra o próprio Estado, suas organizações ou comunidades inteiras.”
O texto cita uma série de outros atentados semelhantes aos da Amia nos anos 1980 e 1990:
Setembro de 1986: atentados com bombas em Paris.
Março de 1994: tentativa de ataque contra a embaixada de Israel em Bangkok, na Tailândia (o carro-bomba bateu perto do local e explodiu antes).
Julho de 1994: atentado contra a embaixada de Israel em Londres, no Reino Unido
Segundo os juízes, “o Ministério de Relações Exteriores do Irã dava proteção diplomática, facilitava a documentação e garantia o transporte de materiais e equipamentos militares para as redes de inteligência estabelecida em outros países. Isso era feito com o uso de embaixadas iranianas, conselhos de cultura iraniana e extremistas radicalizados da comunidade muçulmana locais (“células inativas” ou pessoas recrutadas em mesquitas) assim como empresas que davam uma aparência de legitimidade e eram exploradas para o planejamento e execução de atividades ilícitas”.
Atentado contra a Amia
A explosão do prédio da (Amia) aconteceu pouco antes das 10h da segunda-feira, 18 de julho de 1994. Foram detonados 400 quilos de explosivos que estavam em uma caminhonete estacionada em frente ao edifício onde funcionava a entidade.
Morreram 85 pessoas e 300 ficaram feridas.
Atentado à sede de uma entidade israelita em Buenos Aires, em 1994
Reuters
Dois anos antes houve outro atentado terrorista contra a embaixada de Israel em Buenos Aires, quando foram assassinadas 29 pessoas.
Dias depois do atentado da Amia, um jornal libanês publicou um anúncio de um grupo chamado Ansar Allah que reivindicava a autoria da explosão.
O Ansar Allah é um braço paramilitar do Hezbollah, uma organização política e militante do Líbano.
O Hezbollah é islâmico e xiita, assim como o governo do Irã, e o Estado iraniano tem uma relação próxima da entidade libanesa.
Investigação argentina é marcada por escândalos e mortes
As autoridades argentinas concluíram que os responsáveis pelo atentado terrorista em Buenos Aires haviam sido treinados e financiados por autoridades iranianas.
O primeiro acusado, no entanto, foi um argentino, preso no próprio dia do atentado: um receptador de carros chamado Carlos Alberto Telleldín. Ele vendeu a camioneta usada no atentado. A decisão da Justiça desta quinta-feira absolve Telleldín.
Esse suspeito também é um dos nomes do primeiro escândalo das investigações. O primeiro juiz do caso, Juan José Galeano, pagou US$ 400 mil ao receptador por informações. O encontro foi filmado e divulgado em 1997.
Imagem da fachada atual do local onde ficava o prédio da Amia, em Buenos Aires
Reprodução
Anos mais tarde, Galeano foi processado e preso por encobrir a investigação, assim como dois ex-promotores que atuaram no caso e o receptador de carros.
A Justiça inocentou 22 argentinos acusados de envolvimento em 2004.
O país nunca conseguiu levar os iranianos à Justiça.
País criou promotoria especial para investigar atentado terrorista
Dez anos depois do atentado terrorista, em 2004, o presidente Néstor Kirchner montou uma unidade responsável para investigar o atentado. O promotor Alberto Nisman era o líder.
O procurador argentino Alberto Nisman, que denunciou a presidente Cristina Kirchner de acobertar o envolvimento de terroristas iranianos em atentado a centro judaico em 1994.
Reuters/Marcos Brindicci/File
Dois anos depois, a promotoria argentina acusou formalmente o Hezbollah pela execução do atentado, e o Irã, pela organização.
O governo iraniano nega ter participado do ato terrorista e nunca respondeu aos pedidos da investigação argentina.
Nisman pediu a captura internacional de dez iranianos, e cinco deles são, até hoje, procurados pela Interpol.
Após a morte de Néstor Kirchner, Cristina Kirchner, sua viúva e presidente argentina por dois mandatos, se aproximou da Venezuela, que é uma aliada do Irã.
Ela tentou fechar um acordo com os iranianos, que não chegou a ser posto em prática. O texto estabelecia uma comissão para esclarecer o atentado. A ideia foi mal recebida na Argentina e declarada inconstitucional.
A tentativa de Cristina de formar uma comissão conjunta com os iranianos fez com que Nisman, o promotor apontado por Néstor como o líder da investigação, rompesse com o governo.
Em janeiro de 2015, o promotor acusou Cristina de encobrir os culpados. Haveria, segundo ele, um acordo pelo qual a Argentina venderia produtos agrícolas para os iranianos e, pelo entendimento dele, iria desistir do pedido internacional de captura dos iranianos.
Quatro dias depois de apresentar a denúncia, ele foi encontrado morto no banheiro de seu apartamento em Buenos Aires.

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