Falar em público – e para o público – é uma das principais tarefas das pessoas que ocupam cargos políticos. Transmitir uma mensagem de forma clara e ter um discurso que engaje os eleitores pode ter um peso determinante no êxito ou no fracasso nas urnas durante a corrida eleitoral.
Não por acaso, um dos sinônimos para “deputado” ou “senador” é o termo “parlamentar”. A palavra tem origem no vocábulo em latim “parlar”, que significa justamente “falar”, como explica o professor de português Sérgio Nogueira. Daí vem também parlamento para se referir ao Congresso Nacional, local de trabalho dos políticos.
O g1 conversou com especialistas que analisaram as características do discurso dos candidatos à Presidência da República mais bem colocados nas pesquisas de intenção de votos.
Entre os pontos avaliados estão:
- Capacidade de conexão com o interlocutor;
- Dicção;
- Tom de voz;
- Expressão corporal; e
- Controle emocional.
A especialista em oratória Bianca Celoto observa que os concorrentes alteram o tom dos discursos de acordo com a ocasião. Já a fonoaudióloga Leny Kyrillos aponta que o cansaço provocado por uma campanha eleitoral – seja físico ou mental – afeta diretamente na capacidade de comunicação dos políticos.
Confira abaixo pontos positivos e negativos no discurso de cada candidato, seguindo a ordem da posição na última pesquisa do Ipec:
O ex-presidente Lula durante campanha — Foto: Isaac Fontana/CJPress/Estadão Conteúdo
- “Lula tem um apelo popular absurdo, porque fala a língua das pessoas, tem a habilidade de simplificar o discurso, além de demonstrar emoção”, afirma Leny.
- Para Bianca, o ponto forte na oratória é a capacidade de criar conexão com o público por meio da narrativa e da expressão corporal.
- “Os pontos negativos, sem dúvida, são a dicção e a voz, que está prejudicada por conta da idade”, diz Bianca.
- “O Lula passa a ideia de grande esforço e falta de vitalidade ao falar por causa da voz alterada”, indica Leny.
O presidente Jair Bolsonaro durante evento em agosto — Foto: Adriano Machado/Reuters
- Na avaliação de Bianca, uma das características que favorecem o discurso de Bolsonaro é a conexão que ele estabelece por meio da simplicidade da fala.
- Para Leny, em alguns momentos, ao adotar um discurso com característica de mais autoridade e menos conexão, Bolsonaro gera menos proximidade com as pessoas, além de apresentar expressões faciais rígidas e ter uma articulação vocal travada, “o que constrói uma percepção de agressividade contida”.
- Assim como Lula, o ponto negativo de Bolsonaro é a dicção, na avaliação de Bianca.
Ciro Gomes durante evento de campanha — Foto: Suamy Beydoun/Agif – Agência de fotografia/Estadão Conteúdo
- Para Bianca, a oratória de Ciro é a mais apurada entre todos os candidatos, já que utiliza linguagem conotativa e foge do discurso literal: “Isso aumenta o nível de convencimento”.
- A conexão com o público gerada pela postura corporal e pelas expressões também é um fator favorável para Ciro, segundo Leny.
- Leny avalia que os discursos verbal e não verbal de Ciro são dúbios em alguns momentos, ponto que pode confundir o entendimento da mensagem. Ela também destaca o estilo passivo-agressivo do candidato: “Ele pode não demonstrar na fala, mas demonstra o incômodo de forma não verbal”.
- Segundo Bianca, o ex-governador é extremamente rebuscado e, às vezes, complica em vez de simplificar, o que pode dificultar o raciocínio do eleitor.
Simone Tebet durante campanha — Foto: Priscilla Aguiar/g1
- Leny considera Tebet a melhor oradora entre os quatros candidatos por demonstrar controle da situação por meio de um tom de voz sereno;
- Bianca avalia que a candidata tem uma oratória limpa, um vocabulário acessível e boa dicção, além de buscar conexão com o eleitorado feminino por meio do ajuste de linguagem.
- No entanto, Bianca pontua que, em alguns momentos, principalmente no vídeo, Tebet demonstra falta de traquejo e pode parecer robótica.
- Leny afirma que o controle de Simone, por outro lado, pode causar a impressão de artificialidade: “É um tipo de discurso que corre o risco de passar uma ideia de menos calor, de menos emoção”.
Bianca Celoto chama atenção para uma questão que pode passar despercebida pelos eleitores em meio a um discurso bem elaborado e uma oratória convincente: o uso intencional de dados imprecisos ou errados, que pode ser classificado como desinformação e confundir a população.
“Tanto Lula quanto Bolsonaro e Ciro usam muitos dados, eles vão jogando números. O ponto é que os dois usam dados errados”, observa. “Do ponto de vista de oratória, para convencer quem está assistindo, isso é chamado de ‘elemento logos’, que é da parte da lógica e aumenta a credibilidade da pessoa quando ela fica usando muito dado”, explica.
O g1, ao lado de outros veículos de imprensa, realizou a checagem de falas dos candidatos durante os dois primeiros debates presidenciais. As frases são classificadas como “Fato“, “Fake” ou “Não é bem assim“. (acesse os links acima para conferir)
* Com supervisão de Ricardo Gallo