Novo filme de Park Chan-Wook, conhecido por ‘Oldboy’ e ‘A criada’, não entra para a lista de melhores de sua carreira, mas ainda é prova de que cineasta é um mestre de seu ofício. “Decisão de partir” pode não ser o melhor filme do diretor Park Chan-Wook, ao lado do Oscarizado Bong Joon-Ho (“Parasita”) um dos melhores da Coreia do Sul, mas é mais um resultado de alguém que domina com maestria seu ofício.
A mistura de romance e mistério que subverte o gênero noir com um toque da ironia do cinema do país é uma das mais leves e divertidas da carreira do cineasta – que claramente se entrega a esse seu lado menos denso.
Uma (bem-vinda) surpresa, é claro, para quem o conhece pela ação frenética e desesperada de “Oldboy” (2003), pelo sangue do resto de sua “trilogia da vingança” ou pela tensão sexual (e não-sexual) de “A criada” (2016).
E se a estreia desta quinta-feira (5) nos cinemas brasileiros realmente não se junta à lista de seus clássicos, com certeza evidencia sua paixão pelo cinema e por narrativas atraentes – o suficiente para conseguir uma provável e merecida indicação, inédita, para Park ao Oscar de melhor filme internacional.
Assista ao trailer de ‘Decisão de partir’
Noir à sul-coreana
“Decisão de partir” é, de alma, um noir, sim. Tanto que a premissa já foi contada mil vezes com algumas variações.
Enquanto investiga a morte de um alpinista em uma montanha afastada, um detetive (Park Hae-il) suspeita da atraente viúva (Tang Wei) da vítima, até que as fronteiras entre interesse policial e pessoal ficam cada vez menos claras.
Desta trama à primeira vista simples (muito menos complexas que grande parte do resto de sua obra), o diretor tira algo muito diferente do gênero tão conhecido em Hollywood.
Graças à ironia do cinema coreano e à sensibilidade do cineasta, a relação dos protagonistas estica ao máximo a corda da tensão sentimental sem parecer forçada.
Mérito também dos atores. O contraste da sinceridade do detetive resignado de Park (que esteve em “Memórias de um assassino” e “O Hospedeiro”, de Bong) com a aura de mistério da viúva sombria de Wei carrega a trama ao mesmo tempo em que deixa os personagens equilibrados entre o crível e o extraordinário.
Tang Wei e Park Hae-il em cena de ‘Decisão de partir’
Divulgação
Um novo Park
Mas é Park (o diretor, não o ator. Eles não são parentes) a grande estrela. Filmes como “Oldboy” e “A criada” tinham protagonistas memoráveis e atores inacreditáveis que dividiam melhor as atenções. Em “Decisão de partir”, o olhar do diretor se destaca ainda mais.
Seja no roteiro, escrito por ele com sua antiga parceira cinematográfica Chung Seo-kyung, ou na fotografia atenta, que brinca com transições, flashbacks e sequências de sono, o cineasta talvez nunca tenha estado tão dentro de uma obra sua.
Irônico, já que o filme se afasta de alguns de seus temas favoritos, como vingança e crueldade, para focar em obsessões, amor e até um pouco de humor.
Talvez o respiro seja exatamente o que Park precisava. Pelo menos até o final – quando em alguns poucos minutos o cineasta pega o público de surpresa com um soco emocional.
Meio que para lembrar que a paixão dos protagonistas era meio fofa, meio doentia, mas 100% escrita pelo responsável por “Oldboy”.
Park Hae-il e Tang Wei em cena de ‘Decisão de partir’
Divulgação