A resiliência da democracia brasileira, diante dos esforços de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro para minar a validade da recente eleição presidencial, é uma história que tem quase tudo. Drama de tribunal, alegações infundadas de fraude eleitoral, brigas nos salões do podere dicas esperançosas que a democracia pode não ser tão frágil quanto pareceu nos últimos anos.
Houve, sem surpresa, muito foco nos indivíduos poderosos cujas decisões garantiram que o resultado da eleição fosse respeitado, como um Justiça agressiva da Suprema Corte e os líderes de seus militares. Suas decisões foram, sem dúvida, importantes. Mas focar nas escolhas de algumas pessoas pode obscurecer outra questão importante: a força das instituições democráticas do Brasil – e como isso afeta a vida dos brasileiros comuns.
Eu sei que “instituições” podem soar secas como um tópico – um segundo atrás estávamos falando sobre tumultos, agora estou conjurando visões de papelada e luzes fluorescentes zumbindo – mas fique comigo aqui.
Porque eu quero falar sobre um novo papel sobre as instituições políticas brasileiras por Camilo Nieto-Matiz, professor de ciências políticas da University of Texas San Antonio, e Natán Skigin, Ph.D. estudante da Notre Dame. Parece um pouco com a ciência política escrita por Martin Scorsese – leve na papelada, pesado nos assassinatos e na política das gangues. E embora não seja especificamente sobre Bolsonaro ou a recente eleição, oferece um contexto importante sobre as condições que levaram o país a, e potencialmente a sair de, uma crise democrática.
O sistema de votação eletrônica do Brasil ganhou as manchetes em todo o mundo com a falsas alegações de Bolsonaro, como presidente, de que estava repleto de fraudes.
Mas Nieto-Matiz e Skigin começaram a estudar o sistema anos antes, quando o Brasil começou a implementá-lo em distritos de todo o país. Eles notaram que parecia estar tendo um efeito surpreendente: quando a votação eletrônica foi introduzida em uma determinada área, o crime violento ali caiu rapidamente.
“Isso foi realmente intrigante”, Nieto-Matiz me disse quando conversamos na semana passada. Eles esperavam talvez encontrar uma relação entre votação eletrônica e políticas específicas: talvez um benefício para os cidadãos analfabetos, cujos votos eram mais prováveis de serem contados no novo sistema eletrônico do que no antigo sistema de papel. Mas a diminuição da violência pareceu acontecer quase imediatamente, antes que qualquer nova política tivesse a chance de entrar em vigor. O que poderia explicar isso?
Quando eles se aprofundaram um pouco mais, descobriram que o novo sistema de votação parecia tornar um pouco menos provável que os partidos políticos que ganham votos prometendo bens ou recursos em troca de apoio – o que os cientistas políticos chamam de partidos clientelistas – ganhem eleições. Esses partidos podem ter sido mais propensos a confiar na fraude eleitoral para vencer, levantaram a hipótese dos pesquisadores, o que se tornou mais difícil depois que a votação eletrônica foi introduzida.
Em contraste, os chamados partidos programáticos, que tendem a mobilizar apoio prometendo implementar certas políticas – por exemplo, a agenda esquerdista do Partido dos Trabalhadores, o partido do atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva – tiveram um desempenho um pouco melhor sob o novo governo. sistema. (Os partidos programáticos também podem ter agendas de direita. E nenhum partido é exclusivamente um modelo ou outro, mas eles tendem a se inclinar em uma direção.)
Nieto-Matiz e Skigin se perguntaram se poderia haver uma ligação entre a violência e o tipo de partido que prevaleceu nas eleições, então eles começaram a testar isso com mais rigor – resultando no artigo atual.
Eles examinaram um conjunto de eleições locais tão apertadas que eram essencialmente coin flips, tornando os resultados tão aleatórios quanto seria possível na política do mundo real. Dessa forma, eles poderiam estar razoavelmente confiantes de que as diferenças eram devidas ao tipo de partido que venceu, e não às condições subjacentes do distrito.
Os resultados foram surpreendentes: quando os partidos programáticos venceram, as taxas de homicídio locais caíram imediatamente. Mas quando os partidos clientelistas venceram, a violência em seus distritos na verdade piorou. E, mais uma vez, disseram os pesquisadores, o efeito apareceu rápido demais para ser resultado de novas leis ou políticas.
Um estudo não é suficiente para dizer conclusivamente por que eles encontraram uma correlação entre festas programáticas e violência reduzida, os pesquisadores tiveram o cuidado de observar quando conversamos. Mas eles tinham uma hipótese – e é aí que as coisas começam a ficar no estilo Scorsese.
Eles sugerem que os partidos clientelistas são mais propensos a colaborar com grupos armados locais, que no Brasil incluem gangues criminosas e grupos paramilitares apoiados por proprietários de terras e oligarcas.
A pesquisa mostrou que os partidos clientelistas tendem a ter controles internos relativamente flexíveis sobre membros e candidatos, o que pode torná-los veículos úteis para criminosos que procuram entrar na política – algo que outros estudos descobriram em Índia e Colômbia. Além disso, gangues e paramilitares podem ajudar a se livrar da oposição política, auxiliar em fraudes eleitorais ou entregar os votos de pessoas de grupos ou áreas sob seu controle.
Em contraste, como os partidos programáticos precisam manter a disciplina ideológica, eles tendem a ter controles institucionais mais fortes sobre quem pode ser candidato ou oficial do partido. E eles também podem enfrentar mais reações adversas se os eleitores os perceberem como corruptos ou violentos, porque seu apelo aos eleitores se baseia em quão bem eles cumprem suas agendas ideológicas no cargo. Isso é mais difícil de fazer enquanto estão atolados em investigações ou processos por irregularidades, o que significa que eles têm menos incentivo para colaborar com grupos violentos.
Assim, a teoria diz que, embora as decisões individuais dos políticos possam variar um pouco, os partidos clientelistas têm mais incentivo para entrar em relacionamentos mutuamente benéficos com gangues, paramilitares ou outros atores violentos. E isso deu a esses grupos armados mais impunidade e poder local, o que por sua vez aumentou o crime violento.
O que nos traz de volta à resiliência da democracia brasileira.
A pesquisa mostrou que, com o tempo, os partidos programáticos tendem a expulsar os partidos clientelistas, porque o apoio a estes últimos tende a entrar em colapso assim que eles perdem o poder e não conseguem distribuir recursos aos apoiadores. O trabalho de Skigin e Nieto-Matiz acrescenta a isso, mostrando como o processo também pode reduzir o poder de grupos violentos.
“Devemos esperar que aqueles que são atores criminosos ou atores geralmente coercitivos sejam enfraquecidos ou, se forem capazes de sobreviver, não serão capazes de recorrer a tanta violência”, disse Skigin.
Visto por essa lente, a história mais ampla da democracia brasileira começa a parecer menos um episódio de crise democrática e mais uma turbulência em uma longa, lenta e ainda incompleta trajetória de democratização.
E sugere que a recente eleição, que viu a vitória de um candidato do Partido dos Trabalhadores – o maior partido programático do país – pode ter implicações para a vida do cidadão comum que vão muito além das políticas ou ideologia de seu partido.
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