Como narcotráfico ganhou poder no Equador e violência no país explodiu em 5 anos


Facções cresceram com o desmonte de estruturas de segurança e de combate ao tráfico. Policiais dentro de um presídio em Guayaquil, no Equador
Reprodução/Governo do Equador/Via AFP
Uma onda de violência tem devastado diversas cidades no Equador. O país assiste, principalmente nos últimos cinco anos, uma escalada de poder de grupos de narcotraficantes, resultado de mudanças na dinâmica do mercado de drogas combinadas com o desmonte de importantes estruturas de segurança e de combate ao tráfico.
O confronto entre grupos de traficantes pelo controle da venda de drogas promove uma escalada de violência em diversos pontos do país, muitas vezes com atos de terrorismo, como ataques a postos de gasolinas e hospitais. A decisão do governo de transferir de presídio alguns líderes de facções criminosas, no intuito de conter a situação e inibir as ordens do tráfico de dentro das prisões, acabou por desencadear fortes rebeliões.
Governo do Equador decreta estado de exceção
O decreto de estado de exceção, com toques de recolher, tem sido uma medida constantemente adotada pelo governo para tentar controlar essa onda de violência que já matou diversos policiais, além de causar vítimas nas prisões.
“A política do presidente [Guillermo] Lasso nesses 17 meses já soma nove meses de estado de exceção. Temos passado mais tempo sob ação policial do que em uma situação de normalidade, o que mostra que essa política não está dando resultados”, critica o especialista em segurança Fernando Carrión em entrevista à RFI.
Para medir essa escalada de insegurança, basta comparar a taxa de homicídios no Equador em 2017 – 5,6 por 100 mil habitantes – com os índices atuais, de 20 por 100 mil habitantes. Mas o que teria acontecido nestes cinco anos? Muitos fatores explicam esse aumento no índice de violência, todos relacionados ao tráfico de drogas e a cortes nas políticas públicas.
“[Desde 2017] Foram extintos o Ministério da Justiça, que administrava as prisões, o Ministério da Segurança, o Ministério do Interior, o Conselho Nacional de Controle de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas. Tudo isso foi reunido em um único ministério, chamado Ministério de Governo, e os recursos orçamentários foram substancialmente reduzidos”, explica Carrión.
Cocaína como moeda
Também há cinco anos, os cartéis internacionais, principalmente mexicanos e colombianos, começaram a pagar seus colaboradores no Equador – país de trânsito de drogas peruanas e colombianas – não em dólares, mas em cocaína, favorecendo o desenvolvimento de um mercado local.
Com isso, alguns grupos se fortaleceram não apenas nas hoje violentas e tumultuadas cidades de Guayaquil e Esmeralda, mas também em localidades como Samborondón, Santo Domingo e Durán.
“Até então, basicamente todas as drogas entravam nos Estados Unidos pela Colômbia, contornando o Equador, de avião e navio pela Flórida. A partir dos ataques de 2001, começa a entrada por terra, e é aí que os cartéis mexicanos começam a crescer substancialmente. E essa articulação entre os cartéis colombianos e mexicanos fez com que o Equador se tornasse um país estratégico para a saída de entorpecentes”, esclarece o especialista.
Mesmo antes de 2017, outro fato que marcaria a infiltração de grupos criminosos no Equador seria a mudança da moeda do sucre para o dólar, tornando o país também um local de lavagem de dinheiro. “No Equador, um país pequeno, lavam-se atualmente entre US$ 3,5 bilhões e US$ 4 bilhões, o que representa 4% do PIB nacional”, destaca Carrión.
Neste intervalo, o Peru duplicou sua produção de drogas enquanto a Colômbia apresentou um aumento de 30%. “Entre 700 e 800 toneladas de drogas [por ano] estão saindo do território equatoriano”, ele especifica.
Mercado local
Com essa combinação de fatores, o Equador passa de simples ponto de trânsito de cocaína para um desenvolvido mercado, em que os grupos criminosos que operam o narcotráfico tendem a colocar o governo em xeque.
Estima-se que pelo menos 22 grupos de narcotraficantes fortemente estruturados estejam agindo no país.
Fernando Carrión dá o exemplo do grupo Tiguerones, que atua em Esmeraldas. Ao todo, cerca de 1,5 mil de seus integrantes estariam presos, enquanto aproximadamente 3 mil continuariam agindo em liberdade, o mesmo número de pessoas do ELN (Exército da Libertação Nacional, grupo da guerrilha armada) na Colômbia. “Com a diferença que a Colômbia tem 50 milhões de habitantes, e a província de Esmeraldas tem apenas 650 mil”, ele destaca.
Nesse cenário de expansão de grupos criminosos ligados ao narcotráfico, a repressão vem aumentando e a superlotação nas prisões explodiu. Há um ano já eram cerca de 40 mil detentos no país. Com a política do presidente Lasso de libertar idosos e doentes, assim como presos por crimes menores, esse número foi reduzido para aproximadamente 34 mil, mas, mesmo assim, a situação segue “explosiva” em algumas penitenciárias totalmente controladas por estes grupos.
“A maior e mais complexa prisão do Equador, a penitenciária do Litoral [em Guayaquil], tem mais de 10 mil presos distribuídos por 12 pavilhões. Cada pavilhão é administrado por um desses grupos criminosos. O grande problema que tivemos nesta quinta-feira (3) foi no pavilhão 12 com um grupo chamado Chone Killers, porque decidiram transferir seus líderes para outra prisão, também em Guayaquil, que se chama La Roca, e isso gerou essa revolta.
O especialista explica ainda que, no Equador, os detentos não são classificados nas prisões pelos crimes que cometeram, mas conforme sua filiação com os grupos criminosos, consolidando as organizações criminosas mesmo dentro dos presídios.

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