Há tempos o Universo Estendido da DC (DCEU, em inglês) nos cinemas, precisa de alguém para lutar contra o caos e a desorganização na frente e atrás das câmeras. “Adão Negro”, novo filme baseado nos quadrinhos da editora de Batman e companhia, não é o herói que o estúdio precisa – e nem o anti-herói que ela merece.
Estrelada por Dwayne “The Rock” Johnson, a produção que estreia nesta quinta-feira (20) no Brasil (apesar de inúmeras sessões já nesta quarta, dia 19) nunca sabe exatamente o que quer ser.
Dividida entre a violência de seu protagonista e a pieguice de um roteiro cheio de clichês, a história tem alguns bons momentos, mas fica longe de ser a salvação que a empresa tanto precisa. No lugar, se contenta em ser uma versão madura de “Shazam!” (2019).
Assista ao trailer do filme “Adão Negro” exibido na San Diego Comic Con
A comparação com o antecessor de 2019 é inevitável. Ambos dividem a mesma mitologia nos gibis. Ambos ganham poderes quase divinos ao falarem uma palavra mágica. Ambos soltam raios, voam e têm super força e velocidade.
A diferença é que durante muito tempo tempo Adão Negro era uma versão corrompida do antigo Capitão Marvel (agora Shazam por motivos óbvios). Antagonista lá no início, em 1945, ao longo dos anos ele lutou ao lado dos mocinhos algumas vezes, sem nunca deixar de lado totalmente sua natureza mais brutal.
Esta é a versão do filme, um herói relutante que soa e se comporta muito como o próprio Dwayne Johnson – com talvez um pouco menos de carisma.
Em “Adão Negro”, ele é trazido de volta à vida 5 mil anos após ganhar seus poderes, meio por acidente, e se envolve na luta para libertar seu antigo reino de uma organização mercenária.
Jalon Christian e Dwayne Johnson em cena de ‘Adão Negro’ — Foto: Divulgação
Essa é a mistura do Rock com o Egito
Johnson está ok como o protagonista. Ele inclusive é uma das melhores partes de um filme até esforçado, mas muito limitado.
O problema é que talvez seu carisma no mundo real seja tão grande que por vezes invade a produção. Em muitos momentos, é difícil separar quem é Adão e quem é o ex-lutador de luta-livre.
Infelizmente, o personagem só aparece em toda a sua glória, raios e músculos depois de longos minutos de introdução com uma narração sofrível somados à contextualização do mundo moderno com toques de aventura arqueológica.
Depois disso, as coisas melhoram um pouco. As cenas de ação são bem-feitas e exploram bem o nível de poder e ameaça do herói – apesar de exagerarem um tanto na câmera lenta.
O filme escorrega mesmo é na irregularidade de um roteiro perdido. Personagens com motivações nunca explicadas, referências a clássicos de Velho Oeste jogadas de qualquer forma, boas canções usadas como trilha sonora sem qualquer ligação com a trama ou o momento.
É tanta coisa lançada sem coesão ou sentido que dá quase para relevar o fato de que todos em um reino milenar próximo ao Egito falam inglês com naturalidade – incluindo aí o belo adormecido há cinco milênios.
Dwayne Johnson e Aldis Hodge em cena de ‘Adão Negro’ — Foto: Divulgação
Heróis, final e liderança fora de lugar
Como se não fosse bastante, no meio do caminho, por algum motivo entram quatro heróis de escalões inferiores da DC, determinados a capturar o protagonista.
Pierce Brosnan (o eterno James Bond, de “GoldenEye”) dá um pouco de dignidade à equipe e mostra que merece o salário, mas sua presença, assim como a dos demais, nunca faz muito sentido.
No fim das contas, eles poderiam ser retirados totalmente da história e a jornada do protagonista permaneceria 100% inalterada.
Tudo poderia até ser esquecido, não fosse o retrogosto amargo que final piegas deixa no público. Nada contra mostrar a população se levantando e assumindo a própria luta contra um exército de zumbis em si (ok, talvez um pouco), mas nada ali se encaixa no resto do filme.
Com tom extremamente piegas, diálogos lamentáveis e até uma produção tosca e semi-improvisada, ela é certamente resultado de gravações posteriores geradas pela opinião de algum executivo que achou que faltava algo ao roteiro – que já não precisava de ajuda para ser mediano.
Com uma turbulência enorme nos cargos mais elevados, a Warner Bros. busca alguém para direcionar o navio do DCEU, mais ou menos o que Kevin Feige faz na Marvel.
Johnson claramente tem intenções nesse sentido. Ele talvez até consiga, mas isso vai dizer mais sobre o estúdio e a situação desesperada em que o alto escalão se encontra do que sobre o poder do astro de guiar uma nova era para Superman e seus amigos.
Dwayne Johnson em cena de ‘Adão Negro’ — Foto: Divulgação